segunda-feira, 7 de abril de 2008

MEU MAIS NOVO MESTRE de Lisélia de Abreu Marques

Desde que o Tuty, um cãozinho mestiço da raça Lhasa apso, passou a morar lá em casa, tem mexido com a vida de todos nós. Aquela pequena bolinha de pêlos andando pela casa. Tão fofo! Eu brincava chamando-o de hamster e era preciso cuidado pra não pisar nele. A alegria sempre presente, a brincadeira, os carinhos; é bom estar perto dele. Ele me parecia sempre feliz. Então comecei a prestar atenção nele e tentar descobrir o segredo de sua felicidade. Comecei a perceber que o Tuty vivia apenas o momento presente. Observei como ele se comportava: às vezes em que o deixava preso por algum tempo e depois o soltava, ele vinha correndo todo feliz, cheio de amor pra dar, saltando e comemorando a liberdade readquirida; ele não demonstrava raiva nem guardava rancor por ter estado preso, não ficava se lamentando ou reclamando. Ele curtia o momento da liberdade. Enquanto preso ele não ficava triste e choroso por estar preso, ele encontrava alguma coisa que o agradasse fazer e fazia; brincava com uma bola, rasgava papel, mordia alguma coisa, bebia, comia, dormia. Ele encontrava algo que fosse bom pra ele naquele momento e vivia aquele presente.
Hoje, eu estava angustiada buscando um propósito maior pra minha vida e pensei no meu mestre cachorro, como ele lida com o seu propósito de vida. Ele não tem um propósito de vida, ele se entrega ao propósito que a natureza tem pra ele. Ele simplesmente se entrega à vida. Ele não se preocupa se vai ter ar pra respirar na próxima inspiração, ele respira, ele confia. E vai vivendo momento a momento como se fosse o único.
Fico pensando no Tuty’s life style. Ele não fez terapia, ele não estudou filosofia. Eu imagino que o segredo da felicidade do Tuty seja simplesmente estar conectado com a natureza, com a Divindade; Ele faz parte do todo, faz parte da natureza e é guiado por ela. Já nós, seres humanos (com ego), na nossa busca por controle e poder, resolvemos nos afastar da natureza, resolvemos dominá-la e controlá-la e pelos resultados que se mostram em toda parte, eu acho que não foi uma boa idéia. No nosso anseio de vencer a dor e a morte criamos uma vida muitas vezes neurótica, sozinha, em guerra. Imagino que pra eu recuperar a conexão que o meu cãozinho tem com a natureza terei que fazer um longo caminho de volta. Terapia, filosofia, e todos os outros “...ia” necessários para desconstruir as defesas, as torres, as estruturas artificiais que criamos para nos sentirmos seguros em nossa fortaleza de solidão, criada a partir do afastamento da natureza que, aliás, ainda, estamos destruindo todos os dias.

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